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COMBATENDO O RACISMO ESTRUTURAL

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RACISMO: ÍNDICE CRESCENTE NA BAHIA
Em seis anos, as denúncias de casos de racismo e intolerância aumentaram em 1.210% no estado.
Por Camila Sampaio e Alex Torres
Os números sobre a violência continuam a apresentar a diferença entre negros e brancos no Brasil. Segundo a edição do Atlas da Violência de 2019, 75,5% das vítimas de assassinato eram indivíduos negros, mostrando a continuidade do processo de aprofundamento da desigualdade racial.
A taxa de homicídios de negros (pretos e pardos) por grupo de 100 mil habitantes foi de 43,1, ao passo que a de não negros (brancos, amarelos e indígenas) foi de 16,0. Ou seja, para cada indivíduo não negro que sofreu homicídio em 2017, aproximadamente, 2,7 negros foram mortos.
O Atlas também aponta que, no período de uma década (2007 a 2017), a taxa de letalidade de negros cresceu 33,1%, enquanto a de não negros apresentou um aumento de 3,3%. Analisando apenas a variação no último ano, enquanto o índice de mortes de não negros demonstrou relativa estabilidade, com redução de 0,3%, o de negros cresceu 7,2%.
A desigualdade racial dos homicídios fica mais evidenciada em Alagoas. Na edição do Atlas 2018, já havia sido apontado que o estado apresentava a maior diferença na letalidade entre negros e não negros.

Na Bahia
O levantamento do Centro de Referência de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa Nelson Mandela, apontou que em seis anos, as denúncias de casos de racismo e intolerância aumentaram em 1.210% no estado.
Os números citados até o presente momento foram coletados ao longo de 6 anos, visto que o estudo citado teve início ainda no ano de 2013. No primeiro ano do Centro de Referência, apenas 10 casos de racismo foram registrados. Já no ano de 2016 o número apresentou aumentos consideráveis e chegou ao total de 90 casos ao longo do ano.
A Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA), contabilizou 56 boletins de ocorrência relacionados à crimes de racismo e injúria racial entre outubro de 2018 e setembro de 2019 na Bahia.
A taxa de homicídios de jovens negros na Bahia é quase cinco vezes maior que a de jovens brancos, mostra relatório a Cor da Violência na Bahia, segundo informações da Rede de Observatórios da Segurança.
O levantamento apresentado analisou 10 anos de dados do Sistema Único de Saúde (SUS), mostrando uma evolução de mortes violentas no estado da Bahia.
Os dados mostram que, enquanto a taxa de homicídios no Brasil foi de 27 para cada 100 mil habitantes, em 2018, no Nordeste ela chegou a 40 por 100mil. Já na Bahia, a taxa é 41 por 100 mil, mas em alguns municípios baianos chega a 80 por 100 mil.
Mapa do racismo
O aplicativo Mapa do Racismo e da Intolerância Religiosa, foi desenvolvido pelo Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) sendo a idealizadora, a promotora de Justiça Lívia Santana. Salvador é a capital brasileira mais negra do país, com base nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em 2018, 80% da população se autodeclaram negros.
Para atender a uma das demandas sociais da população majoritária, o aplicativo foi criado para registrar denúncias de discriminação racial, intolerância religiosa, injúria racial e racismo institucional. A ocorrência pode ser feita de forma anônima, para a preservação da imagem do indivíduo denunciante.
O aplicativo foi criado a partir da necessidade de identificar as áreas onde os casos acontecem com mais frequência, para que sejam tomadas medidas educativas de prevenção e correção na área. A ferramenta é a primeira do tipo no país, que tem média de 55,4% da população negra.
Uma das melhorias que foram obtidas com o mapa foi o progresso no trabalho das polícias. De acordo com Lívia Santana, em entrevista para o portal Bahia Notícias, hoje está mais preparada para atender demandas do tipo. "Você chama uma viatura, um policial, um preposto da Polícia Militar e você consegue uma atuação já mais eficiente no que diz respeito ao que fazer e como proceder em casos de racismo", avalia
Os usuários do aplicativo são guiados por tutorial, onde irá aprender a identificar a natureza da ocorrência, com base nas classificações expressas pela lei. Depois que o relato da ocorrência é feito, o registro gera um procedimento no MP. Esse documento é encaminhado ao promotor que atua na cidade em que o caso aconteceu.

Racismo Estrutural
Essa realidade expressa através dos números, só serve para escancarar ainda mais a triste realidade a respeito do tratamento que as pessoas negras recebem em nossa sociedade. De uns tempos para cá, essa forma de preconceito tem ganhado nome dentro da vertente do racismo, que antigamento era designado apenas para situações de violência direta.
Chamado de 'racismo estrutural' ou 'racismo velado', este termo se faz bastante presente no dia-a-dia de cada cidadão, seja na forma de agir ou na forma de sofrer. Ao nos questionarmos o motivo do maior número de homicídios, dos menores salários ou, até mesmo, da maior parte da população carcerária corresponder às pessoas negras, estamos apenas mostrando e reforçando toda a violência que o nosso povo ainda sofre diariamente no Brasil.
Quando adotamos um olhar mais histórico acerca do nosso país, é possível ter uma breve noção do porquê dessa realidade ainda se fazer presente nos dias atuais. Após o fim da escravidão com a Lei Áurea, em maio de 1888, a população negra foi abandonada às margens da sociedade com um pressuposto de 'liberdade', sem que lhe fosse dado nenhuma oportunidade de emprego ou educação.
Anterior a isso, a constituição de 1824 regia que o direito de ir às escolas eram de todos os cidadãos. No entanto, os povos escravizados não estavam inclusos nesse conceito de sociedade, ou seja, não eram considerados como 'população'. Vinte e seis anos depois, a Lei de Terras possibilitou a venda de espaços agrários a custos altos, por parte do governo.
Mesmo com tudo isso, se engana quem pensa que essa situação legisladora veio a se tornar melhor após a proclamação da Lei Áurea. Uma vez que lhes foram tirados terras, educação e trabalho, os negros que eram encontrados na rua ou que praticassem a capoeira podiam ser presos. Essa prática era respaldada na chamada 'Lei dos Vadios e Capoeiras', de 1890.
Para se ter uma melhor noção, a primeira vez que uma lei veio a contribuir diretamente com o combate ao racismo só foi aparecer quase um século depois, em 1989. Na ocasião, a intitulada 'Lei Caó' tornou o racismo um crime inafiançável e imprescritível.
Com base em todas essas informações, fica possível perceber que o racismo não é uma simples forma de preconceito ou uma injúria qualquer, como tantas proferidas por tanta gente em sua rotina. Infelizmente, o racismo é algo maior do que tudo isso e se faz presente em nossa sociedade sem que, muitas vezes, possamos nem sequer perceber a sua existência.
Lei para crime de racismo
O Crime de racismo está tipificado na Lei 7.716/89 e suas alterações posteriores, denominada Lei Caó, em homenagem ao seu proponente, Carlos Alberto Caó de Oliveira; já o crime de injúria está tipificado no código penal, artigo 140, § 3º.
A injúria racial é espécie de crime contra a honra e, pela interpretação dominante na jurisprudência e na doutrina jurídica, tem como sujeito passivo do crime pessoa certa e determinada. Por sua vez, o crime de racismo tem na coletividade de pessoas negras o sujeito passivo. Na injúria racial, o bem jurídico tutelado é a honra subjetiva do cidadão, enquanto no racismo, o bem jurídico protegido é a igualdade entre todos.
Outra diferença é que os crimes contra a honra são processados em juizados especiais criminais por serem considerados de menor potencial ofensivo, geralmente não ocasionam a prisão, mas medidas alternativas de cumprimento de pena, quando não, pode ser ofertada ao acusado a suspensão condicional do processo, já o racismo é crime comum e será ajuizado em varas comuns da Justiça criminal, podendo ocorrer a pena de prisão.
Segundo Clerisvaldo Paixão, coordenador da Secretaria De Promoção Da Igualdade (Sepromi), a diferença nos crimes de injúria racial quando se relacionado a crianças consiste na competência para investigar, ajuizar e processar. Nos crimes que envolvam criança e adolescentes, a compete à Delegacia correspondente instaurar o inquérito e promover a investigação, além de encaminhas ao Ministério Público e à Vara da Infância e Juventude correspondentes para promover a ação penal ou a representação e processá-las.
O racismo é inafiançável e imprescritível, enquanto que o crime de injúria racial, que na verdade é uma qualificadora do crime de injúria simples, prescreve e é passível de fiança.
Denúncia
Denúncias de casos de racismo podem ser feitas por telefone na Bahia. O serviço oferecido está disponível desde novembro de 2019 e faz parte da campanha “Todas as Vozes contra o Racismo. Todas as leis contra os racistas”.
As ocorrências registradas serão encaminhadas para o Centro de Referência de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa Nelson Mandela, instituído com o objetivo de congregar esforços no planejamento e na execução das políticas públicas voltada para a promoção da igualdade racial e proteção dos indivíduos e grupos étnicos atingidos pela discriminação e demais formas de intolerância, oferecendo apoio psicológico, social e jurídico.
Para Marcos Pereira, analista de relações internacionais e pesquisador de assuntos étnico-raciais, é necessário olhar sempre pelo lado histórico para entender os fatos e a busca por justiça e representatividade.
“Historicamente sempre fomos colocados como pessoas ruins, feias, burras e que não tinham capacidade, que serviam apenas para servir aos seus colonizadores. Era uma sociedade escravista que não representava o negro de uma forma positiva, pelo contrário, sempre como uma figura violenta. A importância da auto-aceitação e empoderamento negro, tanto para o sexo masculino como no feminino, as condições que nos levam a essa busca vem através do mito da democratização racial e fatos de violência.”
As denúncias podem ser feitas por vítimas de preconceito racial ou por pessoas que tenham presenciado o crime por meio do telefone (71) 3117-7448, de segunda a sexta-feira, das 9h ao meio-dia e das 14h às 18h.
FORMAS DE COMBATER O RACISMO NA INFÂNCIA
Por Camila Sampaio
O Brasil tem desenvolvido muitas ações relevantes em favor da criança, mas a distância entre políticas públicas e as crianças indígenas, bancas e negras é muito grande e persiste há muitos anos.
Em 1988, Governo Federal fundou a primeira instituição pública voltada para promoção e preservação dos valores culturais, históricos, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira: a Fundação Cultural Palmares (FCP).
A FCP vem trabalhando para promover uma política cultural igualitária e inclusiva. Em sua página na rede social, foi divulgado cinco formas que, se bem trabalhadas na infância pode contribuir de fato e de direito para termos pessoas com respeito às diferenças étnica-raciais e com um sentimento de pertencimento.
5 atitudes que devem funcionar de forma norteadora para os pais na educação dos filhos:
